Um blog sobre coisa alguma.

6.12.07

Pequeno mapa astral em cores da música brasileira popular moderna, o desejo sexual e o apartheid dançante baiano.

De uns tempos pra cá a música brasileira foi dominada pelo Chiclete com banana. Um trio elétrico que conseguiu expandir o carnaval até alguns meses mais pra frente no ano. e, principalmente, até a festa de fim de ano da Globo (depois do Roberto Carlos).
O Chiclete com banana existe há 26 anos, tocando as mesmas músicas com a mesma formação, o mesmo cantor-guitarrista de cabelo sujo, o mesmo suor e o mesmo abadá de sua estréia. Mas até agora ele era simplesmente um trio elétrico do carnaval da bahia como outros tantos que você não deve conhecer. Mas isso mudou e eles se tornaram uma febre, incluindo a loucura de considerar o vocalista jesus-no-fim-do-açoite um símbolo sexual do carnaval do Brasil.
Na verdade a merda não começa neles. Começa com alguém, um filho da puta qualquer, que sugeriu que ficar em pé 18 horas, a maior parte delas embaixo de sol, fedendo, suando e mijando nos próprios pés, ouvindo uma música repetitiva e ensurdecedora, onde todo mundo tenta comer todo mundo mas não consegue porque não se aguenta nas pernas e porque tem nojo do mijo que o outro jogou nas próprias roupas, é o verdadeiro carnaval do Brasil. E lançou a moda de ir pra Salvador no carnaval correr atrás de trio elétrico. Por causa dessa mania, uma espécie de disneylandia moderna, destino de 99% dos adolescentes que deixaram de gostar de cinderela e vídeo-game pra gostar de sexo, é o carnaval da bahia. As agências de viagem faturam com isso tanto quanto os menininhos que vendem pulseira do Bonfim no pelourinho, que já não tem mais o pelourinho.
Ninguém quer ver o pateta, quer é ouvir o chiclete com banana atracada num pluto qualquer no meio da cidade suja. Essa invasão cultural carnavalesca soteropolitana acabou com o verdadeiro carnaval do Brasil, aquele formado pelo trinômio Jamelão/tapa sexo/piada com a mangueira, aquele carnaval dos velhos tempos de atrizes nuas, peitos balançando, biquinis minúsculos e a maior utilização de purpurina que o mundo já viu desde que o Prince parou de cantar.
Esse carnaval, o verdadeiro, aquele que os americanos conhecem, com esculturas de isopor mal feitas e que não respeitam o limite de tamanho da avenida, sendo que o limite de tamanho da avenida é o mesmo há mais de 30 anos, é o nosso carnaval. Onde as rimas ilusão/coração, folia/alegria, divertir/sapucaí faziam a festa dos foliões naquelas 230 repetições do samba enredo nos 600 metros de avenida, aquela coisa bonita de se ver, o povo cantando as 3 estrofes completas do samba, esse tipo de coisa não existe mais. Existe o carnaval de salvador, e como é muito mais fácil convidar o barbudinho pra tocar no programa de tevê do que convidar a bateria da Vai-Vai, eles ainda permeiam os programas musicais chatos no fim de semana.
Mas tem mais pra explicar o sucesso, afinal, tocar no carnaval da bahia um monte de gente toca e não existe uma mania nacional de gostar do Moraes Moreira desde Pombo Correio.
As letras não podem ser atrativas, afinal, você provavelmente não lembra de nenhuma delas, ou seja, elas não são marcantes. Talvez você até consiga cantarolar alguma coisa como "nega do cabelo duro....... penteia" mas deve ser mais pela ligação direta com o vocalista do que pela letra, ou algo como "sou praieiro, chicleteiro, ashdpq daskasnf wpw e0sdc quêêêê...." que nem o próprio barbudinho sabe qual é a letra. Mas isso, ao contrário do que o povo que sabe ler imagina, pode ser o motivo do sucesso, porque você vai pro carnaval da bahia pra não prestar atenção em nada mesmo, o impotante é saber a sonoridade do final da frase, beber e tentar se agarrar com alguém mais bêbado e menos suado que você. As letras só servem pra acompanhar a batida e a guitarra não serve pra nada. As letras são só um brinco numa mulher pelada, digamos assim, Ninguém tá lá pra cantar, vamos assumir, ninguém tá lá pra pensar em letras filosóficas, já que o que conta é a putaria do momento. Então pra que fazer letras cheias de significado? Se isso fosse importante, o trio concorrido era o do Caetano, certo? Mas se considerarmos que uma batida dançante, com um ritmo alucinante e empolgante faz sucesso, por que todo mundo odeia o Olodum e o Carlinhos Brown e a timbalada vende menos cds do que o Robinson Anjo? Vai ver é porque falta uma letra que não faz o menor sentido e não precisa ser entendida, como as do chiclete com banana, há 26 anos. Mas se essa junção de ritmo e letra sem sentido é o motivo do sucesso, temos que acreditar que Jorge Benjor é deus e nós sabemos melhor que ninguém que deus é o Pelé. Portanto deve ter algo mais nisso do que as letras desconexas com a batida forte e a ausência do jamelão pra fazer o sucesso da banda.
Analisando friamente o fenômeno musical dos últimos anos vemos uma desevolução de um dos principais centros de divulgação de som do mundo, as danceterias. Onde antes tocavam bee gees e john travolta, hoje só se ouvem batidas em ritmos iguais mas que recebem sete definições diferentes de quem ouve e treze definições aleatórias dos djs, que nada mais fazem do que colocar um cd mega-festa 1 pra tocar. Ninguém sabe o nome de nenhuma "banda" de dance/techno/psy/psy progressivo/psy hard/psy house/drum'nbass/hip-hop-techo-tramp porque não existe, é só um computador que bate aleatoriamente nas teclas que fazem som. Por que isso acontece? Porque ninguém vai na danceteria pra conversar, vai pra praticar sexo vertical vestido e tentar passar a mão e outras partes pudendas nas outras pessoas, dar uns beijo, tomar umas birita e tentar descolar uma bêbada pra comer no carro. A música tem a única função de distrair as pessoas, dar motivo pra luz apagar e evitar que as pessoas conversem. A partir disso nós chegamos no motivo pelos quais a geração saúde das academias está aumentando tanto. Todo mundo quer ficar bonito-fortinho ou gostosa-oxigenadinha pra poder atrair a pessoa do sexo oposto (ou não) numa balada em que não se precisa conversar, apenas aparecer, brilhar com a roupa e ter a bunda durinha. Por isso a música bomba, o som faz tudo ficar igual e você não fala. Só olha, gosta, aperta e beija. O que define se você vai ser "pegada" ou não é o corpo, a roupa e a cara de fácil. No caso dos homens, a roupa, o corpo e a cara de rico/pintudo/comedor bem-sucedido. E isso aparentemente não tem nada a ver com chiclete com banana, eu sei, mas na verdade o chiclete com banana é a aplicação desse princípio ao ar livre. O interesse de quem vai pro carnaval de salvador é sexual como de quem vai pra uma balada, só que lá não dá pra desligar a luz ou apagar o sol. E lá não tem roupa bonita ou feia porque é todo mundo de shorts, havaianas e abadá suado. Nem o perfume você consegue sentir, já que tudo foi suor abaixo. A diferença entre a baladinha e o trio é que no trio existem outras formas de se diferenciar que substituem a roupa bonita e a luz fraca. Esse meio de se mostrar melhor que a "baranga" do seu lado ou do que o "folgado" da direita é o apartheid que se inicia no primeiro dia do carnaval e, de acordo com sua capacidade intelectual corpórea, dura até a quarta-feira de cinzas: a dança.
Baiano dança por natureza desde que nasce, exceto o jorge amado que tava com preguiça e o Caymi, que não lembra direito o que é preguiça porque não quer se cansar pensando. (um desses dois morreu, mas, assim como o sivuca e o hermeto paschoal, ninguém sabe qual tá vivo). Quem sabe dançar é melhor. Quem sabe a coreografia se destaca, e quem não sabe sobra, tenta aprender ou pega os mais feios pra se divertir. essa diferenciação é explícita e é um orgulho para os que sabem dançar. Que não fazem o menor esforço pra facilitar pra quem não sabe, renegando as barangas e os folgados a se agarrarem entre si e serem os fracassados do carnaval só porque não possuem o molejo de uma carla perez.
Ou seja, pra que você não precise prestar atenção nas letras, a letra não tem que chamar sua atenção, pra você só pegar o ritmo em que deve mexer o quadril pra encoxar alguém, é necessário um batuque bem alto, pra que ninguém olhe pra você e desista de dar pro cara lá de baixo, é necessário um cantor feio e que pareça jesus (ninguém tem fantasia de fuder com Jesus, pelo menos não Jesus suado, eu espero), o cansaço sob o sol tem que ser grande pra você pegar quem tá mais perto ao invés de procurar, por isso toda música do Chiclete com banana grita, uma hora ou outra, tira o pé do chão (quem já viu o filme do Rocky sabe que pular cansa) e deve ter uma hora na música em que todo mundo grita o refrnao, que é pro pessoal poder respirar um pouco entre uma mão boba e um rala-coxa. O mesmo princípio que lota as academias e inventa a loucura chamada "aula de axé" é o que lota os shows do chiclete com banana e seu apartheid da cintura. E isso foi criado pelas danceterias em que só a gostosisse é responsável pelo seu sucesso na busca por putaria. Como sempre, o que move tudo é a busca por putaria, conforme já citado por aqui. Ou seja, se você é feio, não sabe dançar e não é fortinho, o jeito é procurar uma namorada num cinema desses que passam filme iraniano. Se você é feio, não sabe dançar, não é fortinho e é burro pra conversar com uma dessas do cinema, o jeito é você ser rico. Se além de tudo você é pobre, desiste rapaz.