Um blog sobre coisa alguma.

24.7.07

Esquisito

É meio complicado definir o que é uma pessoa normal. Até você ver um esquisito. Aí fica fácil. Tudo que é diferente do esquisito é normal. Inclusive você deve ser bem esquisito pra um cara esquisito, porque ele se acha normal. No fundo ele se acha normal, mas é irritantemente orgulhoso de sua própria esquisitice. E não admite de forma nenhuma ser considerado normal, pois ele foi talhado pelos deuses para ser diferente de todo mundo.
Mesmo que olhando para ele e seus amigos, todos pareçam iguais. Eles se acham iguais por serem diferentes. Até porque, a mente humana é criativa mas não é capaz de inventar esquisitos de tantas espécies diferentes. E a necessidade de viver em grupo faz com que os esquisitos, ao achar um grupo que seja parecido com ele, deixe parte de sua esquisitice de lado só pra ter amigos.
No íonibus, eles são esquisitos. Homens de blusas femininas e cachecol, por exemplo. Cabelos esquisitos, as moças gostam dele bem armado, já que agora a moda é chapinha. As saias são bem curtas, até as meninas ricas começarem a usar pra ficarem bonitas, aí as esquisitas vão usar as saias compridas.
Aliás, ficar bonito é o que todo mundo quer, daí vem a vontade nata dos esquisitos de serem feios. E mesmo quando não são feios por vontade divina, eles se vestem, tatuam e se pintam de forma a ficar feios. O feio é bonito em um mundo onde só o bonito é belo. Esquisitos são estranhos.
Tudo que as menininhas ricas, ou patricinhas, usam, para as esquisitas não serve. Elas chegam a gastar mais que as meninas ricas gastam só pra comprar roupas que as ricas oficiais não comprariam.
Elas são ricas. E esquisitas. Ao invés de gastar uma fortuna numa loja convencional, gastam essa fortuna em um casaco velho de um brechó mal acabado numa esquina desconhecida.
É o preço que se paga para ser diferente.
Mas vale a pena. Afinal, cada vez que eles passam pela rua, um grupo de pessoas pára e fica observando aquele bando de esquisito, que, de tão esquisito, finge não ligar para a opinião dos outros. Mesmo tendo gasto dinheiro em roupas esquisitas, tempo para maquiagens esquisitas, cérebro para conhecer bandas esquisitas e atitudes esquisitas, tudo para chamar a atenção. A atenção que eles não querem chamar. Mas chamam porque, segundo eles, "têm estilo". Como todo mundo é heterossexual, a maioria é homeossexual. Mas agora que a homossexualidade virou assunto obrigatório em novela das oito, eles se tornaram bissexuais. Só que veio a Ana Carolina e disse que é bi também, e isso passou a ser normal. Então eles são pan-sexuais. Porque, mesmo que o Serguei insista em dizer que também é, o Serguei nunca poderá ser considerado normal.
Eles são pan-sexuais porque não se importam com as formas sendo que existe carinho. Por isso a maioria é peluda, barbuda, gorda, e fede um pouco. Mas o importante é o sentimento. Que pode ser nutrido por uma pessoa, um animal, uma árvore ou uma lata de leite em pó. O prazer é o que importa. Já que todo mundo se preocupa com o corpo e com a aparência, eles, como bons esquisitos, gostam do sentimento. Durante muito tempo usaram drogas. Agora que as drogas estão na moda, eles tomam sopa de tofu nos shows de bandas que ainda não tocaram em rádios. Eles discutem Dostoyevski e não sabem quem é o Alemão do BBB. Eles vão a bares vegetarianos e comem soja, mas não a transgênica.
Eles dão valor às coisas velhas como roupas, malas de viagem, abajures, bordados, tricô, cadeiras antigas, discos de vinil e sapato com lacinhos. Só que os sapatos de lacinho voltaram à moda esses últimos tempos, agora eles não estão usando mais.
Músicas com menos de 50 anos não agradam, e se possível, além de antigas, devem ser bem desconhecidas. Bandas modernas, desconhecidas e que tocam músicas antigas desconhecidas são o máximo. Até tocarem no rádio pela primeira vez. Músicas nacionais, claro, pois gostar de coisas estrangeiras é muito fashion, não serve pra eles. Mas eles falam outras línguas. Normalmente se dividem entre o italiano, e o francês. Inglês e espanhol é pra idiota.
Sempre compram carros velhos como fuscas de cores estranhas, brasílias de cores estranhas e outros carros antigos de verdade. Além de vespas, já que uma Bizz é moderna demais pra um esquisito.
Quando se entra no mundo dos esquisitos não se tem muita chance de voltar.
É um lugar que dá medo.
Eu não conheço nenhum ex-quisito.
Mas eu tenho certeza que muita gente já me achou esquisito.

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